Paixão: maior ativo do esporte como conteúdo e a principal fragilidade

Fonte: Mundo do Marketing 13 Jun 16

O engajamento dos brasileiros com o esporte é notório. O futebol é o grande expoente, porém, é fácil observar uma série de outros sinais que, não apenas reforçam, mas ampliam esta ideia. Basta perceber o espaço dado ao tema nos diferentes veículos, como televisão (aberta e sobretudo fechada, com seus diversos canais), universo digital ou mídias impressas, apresentando o esporte sempre maior do que todos os demais conteúdos de entretenimento. Espaço este que não existiria caso não houvesse interesse do público.

Notamos também que, historicamente, boa parte dos “heróis brasileiros” advém do esporte, como Pelé, Ayrton Senna, Guga, ou mesmo os recentes Arthur Zanetti e Gabriel Medina, este último com a peculiaridade de muitos dos seus admiradores não entenderem exatamente como ele se tornou campeão mundial, isto por não acompanharem os eventos e não conhecerem o sistema de competição.

Observar o comportamento nas “redes sociais” também trás aprendizados muito ricos. Vemos, por exemplo, inúmeros compartilhamentos de proezas de atletas paralímpicos como inspiração de perseverança e superação. Jovens dividindo cenas impressionantes de esportes de ação, inspirando a quebra de limites antes inimagináveis. Selfies de pais orgulhosos com seus filhos em festivais em academias e escolas, das mais diversas modalidades.

Em uma época onde já está mais do que clara a necessidade das marcas oferecerem conteúdos
relevantes e capazes de gerar engajamento com seus públicos, atitudes como estas demonstram nossa paixão pelo esporte e, consequentemente, seu poder de geração de resultados para as marcas.

Contudo, esta mesma paixão, que certamente representa o maior ativo do esporte, torna-se sua maior fragilidade, à medida que permeia boa parte das decisões dos gestores, sejam eles de entidades esportivas ou das próprias empresas patrocinadoras.

No caso das entidades esportivas, podemos dizer que muitos dos seus gestores agem como torcedores. Claro, desconsiderando àqueles apenas com interesses pessoais fraudulentos ou políticos que, quando presentes, comprometem definitivamente a conduta e o futuro da entidade. Porém, mesmo àqueles que atuam como torcedores e acreditam nesta “atitude de doação”, ao tomarem decisões alicerçadas basicamente em suas emoções, prejudicam fortemente suas entidades.

Ao invés de buscarem a valorização de seus ativos, orientados por uma visão estratégica e administrativa de médio e longo prazo, com boas práticas de gestão e governança, diversificação de receitas, estreitamento de vínculo com seu mercado e a elevação do patamar de entrega aos patrocinadores, dirigem seus esforços apenas para resultados esportivos de curto prazo.

O que vemos, portanto, é um ciclo vicioso de imediatismo instalado e uma indústria que “anda de lado” – na melhor das hipóteses, pois muitas vezes “andam para trás”. Ao passo que, todos os exemplos mundiais de adoção de boas práticas de gestão promovem resultados esportivos no médio prazo melhores e mais sustentáveis. É claro que o retrato não ajuda em nada, mas dado este cenário vicioso, é compreensíveis ver “algum “apaixonado tentando salvar sua entidade (modalidade, clube etc)” com todo seu empenho emocional.

Por outro lado, confesso que ainda me surpreendo mais ao ver o quão forte esta paixão está presente na rotina das empresas. Decisões de patrocínios, muitas vezes com volumes importantes de investimentos, são orientadas por emoções pessoais de grandes lideranças da companhia. São comuns os casos da escolha por modalidades que admiram ou praticaram quando jovens, ídolos pessoais, clubes do coração ou mesmo influência de amigos, buscando se inserirem em determinados grupos sociais.

Ou seja, dão vazão aos seus sentimentos ao invés de analisarem criteriosamente as necessidades de suas marcas e as melhores oportunidades do mercado. O curioso é notar como esta atitude muda radicalmente com relação à outras atividades de marketing, para as quais buscam tecnicidade em sua gestão, como trade marketing, marketing digital entre outros, mesmo com investimentos semelhantes (que dificilmente convivem com paixões pessoais).

É comum presenciar muitos destes líderes ou suas equipes de marketing não conseguindo justificar seus patrocínios, dada a falta de planejamento e análise técnica. Com isso, estão entre as colocações mais comuns a determinação “top-down” na companhia ou a simples busca por visibilidade – ainda a tônica do mercado brasileiro, mas que representa um grande desperdício do investimento realizado e de oportunidades, vistos inúmeros exemplos internacionais.

É importante frisar que, neste “jogo das paixões”, os gestores das entidades esportivas historicamente têm se valido muito mais das emoções dos executivos do que o inverso – mesmo que neste momento estejam se defrontando com um cenário extremamente desafiador. Afinal, sempre acabaram “encontrando algum novo investidor” para seguirem “empurrando suas entidades”.

O fato que parece mais do que concreto é que, caso não tenhamos uma mudança nestas esferas de decisão e um rompimento neste ciclo, com o uso de técnicas efetivas de gestão, pela parte que for, dificilmente teremos qualquer alteração significativa neste quadro. Com isso, seguiremos com uma indústria do esporte em seu permanente desafio de sobrevivência e empresas desperdiçando o uso desta plataforma como conteúdo relevante na construção de suas marcas e de vínculo com seus mercados.

Alguns movimentos por melhores práticas foram vistos nos últimos anos e certamente precisam amadurecer, originados por diferentes frentes, como atletas e ex-atletas (Bom Senso e Atletas pelo Brasil), patrocinadores (Pacto pelo Esporte) ou mesmo o governo. Porém, seria ótimo que o nosso campeonato brasileiro de futebol em andamento estivesse convivendo com uma discussão mais rígida quanto ao cumprimento do Profut, por exemplo.

Como já coloquei anteriormente em outros artigos, é neste contexto de carências que estão as melhores oportunidades no médio e longo prazo, sobretudo para as empresas e marcas patrocinadoras, desde que se oriente para elas, valendo-se inclusive da atual adversidade econômica do país

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